segunda-feira, outubro 02, 2006

Negociação de Abel Pereira com Vedoin denuncia tucanos

Operador de Barjas, braço direito de Serra, não se arriscaria tanto pelo silêncio dos Vedoin se não houvesse nada comprometedor

Nas últimas semanas do mês de agosto, a cidade de Cuiabá recebeu uma visita algo insólita. O empresário Abel Pereira, de Piracicaba, hospedou-se no apartamento 417 do hotel Taiamã. De lá, comunicou-se várias vezes com os donos do grupo Planam e principais envolvidos no escândalo das ambulâncias, Darci e Luís Antonio Vedoin. Alguns dias depois, ainda em agosto, o mesmo Abel Pereira voltava a Cuiabá. Repetiu o que fizera na visita anterior, e suas comunicações com os Vedoin foram registradas pela Polícia Federal, que estava monitorando os tele-fonemas destes.

RISCO

O que havia de insólito nas visitas e na conduta de Abel Pereira não é difícil de perceber: por que um milionário, cuja família é proprietária de 11 empresas que vão muito bem de vida, e que até então não havia sido mencionado nos jornais, revistas ou TV, viajaria a Cuiabá para manter contato com dois réus que estavam no centro de um escândalo que ocupava todos os jornais, revistas e noticiários televisivos? Obviamente, para quase todos os empresários do país, a companhia dos Vedoin era algo pior do que a companhia da lepra. Queriam vê-los longe, até porque não tinham nada a ver com seus mal-ajambrados negócios. No entanto, alguma coisa fez Abel achar que valia a pena correr o risco de chamar a atenção da polícia para a sua pessoa – ou, talvez, ele não tivesse outra alternativa.

Somente no dia 15 de setembro, com a publicação da entrevista dos Vedoin na “IstoÉ”, é que se soube que o hóspede do apartamento 417 do hotel Taiamã era, além de milionário e dono de empresas em Piracicaba, o operador de Barjas Negri, braço direito e sucessor de Serra no Ministério da Saúde. Barjas é, há muito tempo, a pessoa mais próxima de Serra, personalidade que, sabidamente, não tem muitas pessoas próximas. Barjas, hoje guindado à prefeitura de Piracicaba, nunca teve na política o que se chama luz própria – sempre foi considerado não mais que um homem de Serra.

Quanto a Abel, era através dele, segundo o relato dos Vedoin, que as verbas para a compra de ambulâncias eram liberadas, evidentemente com um pedágio sobre o valor desses recursos.

LEILÃO

Assim, não era estranho que Abel estivesse em Cuiabá no final de agosto. Segundo agentes da PF ouvidos pela “IstoÉ”, Abel Pereira foi a Cuiabá oferecer R$ 4 milhões aos Vedoin para que não entregassem à Justiça os documentos que provavam a ligação com ele e Barjas. E, realmente, apenas no dia 13 de setembro, um dia antes de concederem entrevista à revista “IstoÉ”, esses documentos foram protocolados na Justiça federal.

Porém, desde a primeira quinzena de agosto, segundo a própria imprensa, os Vedoin falavam em entregar nova documentação à Justiça e à CPI. A revista “Época”, em especial, registrou o fato, numa matéria em que, por alguma razão, tratava de desestimular essa entrega, levantando que ela poderia provocar a revogação da “delação premiada” pela qual os Vedoin permaneciam fora da cadeia.

Logo depois disso, na segunda quinzena de agosto, Abel Pereira aparece duas vezes em Cuiabá e contacta com os Vedoin. Sobre isso, um agente da PF disse à “IstoÉ” que “os Vedoin fizeram um verdadeiro leilão com as informações que têm”.

Seja como for, Abel não iria se arriscar a ser envolvido publicamente com os Vedoin – como acabou acontecendo – se essas informações não fossem verdadeiras e comprometedoras. Aliás, é significativo que ele não tenha enviado um intermediário. Provavelmente, o que estava em risco era importante demais para que ele confiasse em um preposto. Ou, mais precisamente, Abel e os que estavam por trás dele sabiam que os Vedoin não aceitariam um preposto, pela simples razão de que já o consideravam um preposto.

PREPOSTO

É exatamente, aliás, o que os Vedoin disseram a “IstoÉ”, na entrevista feita em setembro, portanto, depois das tratativas com Abel, que foram nas últimas semanas de agosto. Literalmente:

ISTOÉ – Quem é Abel Pereira?

Luiz Antônio – É um empresário de Piracicaba que operava dentro do Ministério da Saúde para nós. Era ele quem conduzia todo o processo e fazia sair todos os empenhos... Era um operador, uma pessoa indicada e muito ligada ao Barjas Negri, secretário executivo do Ministério quando José Serra era o ministro e seu sucessor.

Darci – O Barjas Negri é o braço direito do José Serra. Nosso esquema já funcionava no Ministério. Quando o Serra saiu, o Barjas assumiu o Ministério e foi indicado o Abel para continuar a operar.

Portanto, em relação aos Vedoin, Abel sempre foi um preposto, assim era conhecido e assim se apresentava. Os Vedoin não iriam negociar com o preposto de um preposto. Daí a necessidade do próprio Abel ir a Cuiabá.

Estabelecida a sua condição de preposto, a questão é: em nome de quem Abel ofereceu R$ 4 milhões para que os Vedoin ficassem calados e não entregassem a documentação à Justiça? Em outras palavras: Abel era preposto de quem, quando foi a Cuiabá começar esse leilão de documentos e provas?

Ou, usando o velho princípio do Direito Romano: a quem beneficiaria nesse momento o silêncio dos Vedoin? Quem sairia prejudicado se todas as provas que estavam com os Vedoin fossem divulgadas naquele momento? Que acontecimento era tão importante que Abel e seus mentores arriscaram tanto para que não fosse influenciado pela divulgação dessas provas?

CARLOS LOPES

http://www.horadopovo.com.br/pag3.htm

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