A origem do dinheiro do dossiê e os detalhes da ligação dos tucanos com os Vedoin só depois do segundo turno
Por Leandro Fortes
O mistério sobre a participação do empresário paulista Abel Pereira e do ex-ministro da Saúde Barjas Negri, do PSDB, na máfia das ambulâncias deverá repousar, até o fim da campanha eleitoral de segundo turno, na mesma vala comum da investigação sobre a origem do dinheiro para a compra do dossiê anti-Serra. No Congresso Nacional, a CPI dos Sanguessugas patina na falta de informações, mas tenta correr, solitária, atrás das informações sobre o conteúdo da papelada. Um relatório encaminhado ao Ministério da Justiça, pela Polícia Federal, na semana passada, evidenciou a incapacidade de descobrir, até o fim do mês, de onde veio o equivalente a 1,7 milhão de reais apreendido em um hotel de São Paulo, em 15 de setembro, nas mãos dos petistas Gedimar Passos e Valdebran Padilha.
Vítima. Não há nada contra Freud Godoy |
Segundo informações da PF, é necessário investigar pelo menos dez corretoras ligadas ao Banco Sofisa, de São Paulo, responsável pela transferência de 110 mil dos 248 mil dólares apreendidos com outro 1,16 milhão de reais no Hotel Ibis. Além da dificuldade de conseguir a colaboração espontânea dessas instituições financeiras, todas protegidas pelo sigilo bancário, prevê-se ainda mais morosidade por conta do envolvimento de doleiros.
De acordo com a PF, o processo é naturalmente demorado porque, a cada descoberta, é necessário conseguir autorizações judiciais para quebras de sigilos dos envolvidos. Há, ainda, o perigo de, ao investigar as contas dos doleiros, se colocar no olho do furacão pessoas que nada têm a ver com a origem do dinheiro usado para a compra do dossiê. Teme-se, por exemplo, o surgimento de nomes de parlamentares ligados ao PT ou ao PSDB, o que daria combustível para a fogueira eleitoral. O diretor-geral da Polícia Federal, delegado Paulo Lacerda, receia, com isso, especulações sobre a utilização política da corporação.
Outro complicador é a dificuldade de rastrear as notas de reais encontradas pela polícia. O Banco Central informou à PF não fazer o registro dos números de séries das cédulas emitidas no País. Por isso, segundo o relatório dos policiais, a origem do dinheiro do dossiê só será anunciada antes do fim do segundo turno se os investigadores, num golpe de sorte, descobrirem alguma resposta na papelada de movimentação financeira das corretoras. Ou se os principais envolvidos decidirem falar.
O principal deles é o engenheiro Hamilton Lacerda, ex-chefe da Comunicação Social do comitê de campanha do senador Aloizio Mercadante, do PT, candidato derrotado ao governo de São Paulo. Mas a PF reconhece ser pouco provável que os envolvidos falem alguma coisa agora, principalmente porque estão orientados pelos advogados a permanecer em silêncio. Por isso, vai continuar no rastro do dinheiro.
A PF quer saber, ainda, por que o nome de Freud Godoy, ex-assessor do Palácio do Planalto, foi envolvido na trama por Gedimar Passos. As investigações apontam para uma total falta de indícios do envolvimento de Godoy na compra do dossiê anti-Serra. Também o procurador da República Mário Lúcio Avelar, que pediu duas vezes a prisão temporária do ex-assessor, está convencido da inocência dele. A perícia nos celulares de Passos revelou telefonemas entre ele e Godoy, mas todos os contatos foram feitos em agosto. Naquele mês, a empresa da mulher do ex-assessor prestou serviços de varredura telefônica no comitê de reeleição de Lula e na sede do diretório nacional do PT, em Brasília.
Avelar. Recuo após excessos no caso |
Na CPI dos Sanguessugas, foi nomeada uma comissão para tentar descobrir, em Mato Grosso, se outra informação do delegado Edmilson Bruno é verdadeira. Depois de afastado das investigações, Bruno afirmou que a papelada divulgada pela PF era, na verdade, um minidossiê. A peça inteira teria cerca de 2 mil páginas. O grupo é formado pelos deputados Júlio Delgado (PSB-MG), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Carlos Sampaio (PSDB-SP). A viagem deles a Cuiabá está prevista para o início desta semana. Eles querem conversar com o procurador Mário Lúcio Avelar, o delegado Diógenes Curado Filho, o juiz federal do caso, Jéferson Schneider, e com Luiz Antonio Vedoin. “O que existe na CPI é insuficiente para esclarecer o conteúdo do dossiê”, diz Vanessa Grazziotin.
De fato, tudo o que a CPI tem é um envelope conseguido pelo deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), no qual constam recibos, cheques e o DVD do evento de entrega de ambulâncias, em que o governador eleito de São Paulo, José Serra, do PSDB, aparece ao lado de parlamentares ligados à máfia dos Vedoin. Um papel, no entanto, ainda precisa ser analisado. Nele, Luiz Antônio Vedoin escreveu, à mão, uma lista de prefeituras beneficiadas pelo esquema e registrou nas margens um porcentual de 6,5%. Seria, supostamente, a comissão cabida ao empresário paulista Abel Pereira, da Cicat, ligado ao ex-ministro da Saúde Barjas Negri, do PSDB. Atual prefeito de Piracicaba, Negri sucedeu a José Serra na Saúde.
Abel Pereira. Há indícios de que ele negociava, em nome do PSDB, o silêncio dos Vedoin |
Ao mesmo tempo, a Polícia Federal abriu um processo de sindicância para apurar a participação do delegado Edmilson Bruno no vazamento das fotos do dinheiro apreendido com os petistas. Bruno participou da apreensão como delegado plantonista, mas, afastado da investigação, infiltrou-se ilegalmente no laboratório de perícia e registrou as imagens dos dólares e reais. Em seguida, distribuiu as fotografias para jornalistas na calçada em frente à Superintendência da Polícia Federal, em São Paulo. A direção geral suspeita que o delegado tenha recebido dinheiro. Caso isso seja comprovado, ele poderá ser processado criminalmente e expulso da corporação. Na semana passada, ele entrou de licença médica.
Para Francisco Garisto, presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Edmilson Bruno agiu como franco-atirador, mas não recebeu dinheiro algum. Segundo ele, o delegado tomou para si a responsabilidade de dar continuidade a um expediente comum a todas as apreensões de valores feitas pela PF. “Todo dinheiro apreendido sempre foi mostrado”, alega Garisto. Ele lembra que, em obediência às normas do inquérito, o dinheiro foi fotografado no ato de apreensão. Ou seja, as imagens foram registradas antes da ação do delegado Bruno. Para o presidente da Fenapef, a sindicância deveria ser feita para descobrir quem deu a ordem para esconder as imagens, e quem a obedeceu. “O melhor seria que os candidatos, tanto do PT como do PSDB, deixassem a Polícia Federal em paz”, afirma.
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